UM LIVRO, UM CD, UM FILME

UM LIVRO, UM CD, UM FILME

Todo mundo tem preferências eternas e preferências momentâneas no que se refere a livros, cds e filmes. E, pra nossa sorte, tem muita coisa boa pra se ler, ouvir e ver. Melhor assim.

Seguem 3 que estão me rondando ultimamente.

“Os Dez Mandamentos”, Vários Autores – Ed. Bertrand Brasil – 2001 Lojinha

Não se engane. Nada mais crédulo e menos religioso do que esse livro.

Aparentemente é uma simples reunião de dez contos, escritos por dez grandes autores da Literatura Brasileira Contemporânea. Entre eles, Carlos Heitor Cony, Orígenes Lessa, Helena Silveira, Moacir C. Lopes, Luis Fernando Veríssimo. Cada um deles se inspirou em um dos dez preceitos negociados entre Deus e Moisés durante quarenta dias e quarenta noites do alto do Monte Sinai para criar uma história que, reunidas, revelam a fragilidade do homem diante do desejo de transgredir cada parte da severa legislação escrita nas tábuas da lei. E é aí que o livro deixa de ser uma simples reunião de historinhas. Desejo x Lei é e sempre foi o grande nó do ser humano, que inventou essa coisa de viver em sociedade e não deu conta do recado até hoje. Roubo, adultério, cobiça, mentira, traição, morte, raiva, inveja e outras coisinhas simpáticas fazem parte dessa natureza indomável das pessoas, que precisa ser reprimida pra tornar possível a convivência do modo como a entendemos. Deus e Moisés sabiam disso, e no fundo, todos nós sabemos. Só que os autores desses contos souberam colocar essa angústia em palavras.

Há contos belíssimos, outros emocionantes, outros graves. De todos, o do Luis Fernando Veríssimo sobre o “não matarás” é simplesmente embasbacante. Felizmente, Veríssimo é tão bom em outros estilos quanto é no humor, e esse conto diz muito sobre a vida e o que ela é. Deus, em primeira pessoa, vai contando as dúvidas e angústias que tinha enquanto compunha seus primeiros personagens e os via guiando seu próprio destino, muitas vezes à revelia do autor: Adão, Eva, Abel… E Caim. Contar mais é pecado. Só lendo pra saber. Mas tem um pequeno diálogo entre Deus e Caim que merece a citação:

“- Não é o Senhor quem decide nossas vidas?
– Só até certo ponto. Veja.
Mostrei a fruta em que Eu estava trabalhando no momento, e que viria a ser a laranja.
– Eu faço o protótipo da fruta e coloco dentro as sementes. Meu trabalho termina aí. Na semente está o destino certo da fruta, mas seu único destino certo é ser esta fruta e nenhuma outra. Destino não é biografia. Na sua semente está o seu destino final, mas sua biografia é você quem faz. Onde estas sementes cairão, onde esta fruta nascerá e como crescerá, que uso farão dos seus gomos, nada disso é comigo.
– Eu, então, sou como essa fruta. Um invólucro de semente entregue ao acaso.
– Ao acaso, e à sua decisão. Pois, ao contrário da fruta, você tem vontade própria. Pode determinar sua vida, escolher o seu caminho, mudar de rumo se for preciso. Só não pode mudar o destino que Eu implantei em vocês como uma semente.
– E qual é o nosso destino?”

Boa pergunta.

“O Bloco do Eu Sozinho”, Los Hermanos – BMG, 2001 Lojinha Letras

Os caras dos Los Hermanos são aqueles que deviam ter processado muitos outros por terem feito plágio descarado da tal Anna Júlia ( “oooooooo, Carlaaaaaaaaa…” ) aquela música legalzinha, mas cansativa que tocou à exaustão uns anos atrás. Mas ao invés de fazer isso, eles resolveram fazer coisa melhor. E olha… Põe coisa melhor nisso.

Não conhecia “Bloco do Eu Sozinho” até uma semana atrás ( o título já diz tudo ). Por acaso, procurando uma música, achei outra ainda mais “sentimental” e acabei ouvindo. E caí de joelhos. Achei um absurdo alguém entender tão bem uma dor de amor. Achei que era só comigo que certas coisas aconteciam ( a gente sempre acha ). Indo atrás do resto do bloco… Me apaixonei instantaneamente. Tudo aquilo é verdade. Amar é sofrer, e sofrer muito, que sofrer pouco é besteira. E sofrer em grande estilo não é coisa pra qualquer um.

Quase todas as faixas são a expressão mais crua, poética e profunda de uma dor-de-cotovelo daquelas, e, como se não bastasse, um trabalho muito bem feito, cuidado nos menores detalhes. Os acordes dissonantes e distorcidos se juntam com a voz meiga, harmônica e dolorida de Marcelo Camelo, enquanto instrumentos de diferentes portes e potências vão disputando espaço de uma maneira que beira o limite entre o equilíbrio e a loucura. E no final, dá tudo certo. Canções calmas, baladas delicadas, sambas simpáticos, agudos doloridos e batidas raivosas vão se misturando e compondo um verdadeiro retrato do que é a tristeza de ser deixado, da melancolia da solidão, da raiva de ter sido feliz e ver tudo acabado. Dói. E eu fiquei surpresa de ver que pra mim ainda está doendo.

Fazia tempo que eu não chorava ( não sei se já disse isso aqui, mas não sou de chorar ). Mas tive que chorar ouvindo algumas dessas canções. Afinal… “Quem é mais sentimental que eu?!?”?

“O Fugitivo”, de Andrew Davis – EUA, 1993 Lojinha

Pôster do FilmeMuito já se falou sobre esse filme. Sim, é blockbuster de primeira, com cenas de ação que tiram o fôlego, alta produção, orçamento caro, um mega-astro no papel principal e uma edição de som que, mesmo 10 anos depois, deixa muita gente no chinelo. O filme é estrelado pelo charmosérrimo Harrison Ford, acompanhado do ganhador do Oscar Tommy Lee Jones, que roubou toda a cena como Agente Guerard. A história é de um antigo seriado de TV, e já tinha certa aceitação popular. Enfim, o filme tinha que ser o sucesso que foi.

Mas pra mim, “O Fugitivo” é mais do que simples entretenimento. É uma história de obstinação. Uma lição sobre a teimosia.

A sinopse está aí em cima, mas em linhas gerais, um médico corretíssimo é acusado e condenado à morte pelo assassinato da mulher que amava. Num golpe de sorte ( esse “golpe de sorte” é uma sequência de ação de 10 minutos incrível e asfixiante ), ele consegue escapar da cadeira e passa a se dedicar a provar sua inocência, juntando as peças de um quebra-cabeça. Um policial federal, junto com sua equipe é chamado para capturá-lo, e se dedica com a mesma força a prender o suposto criminoso. Uma briga e tanto.

Em muitos momentos, é desesperador ver o bom médico, mancando, triste, acuado, escapando por entre os dedos do não menos bom policial a cada sequência, mais liso que sabonete. Sempre que vejo o filme, me pergunto por que um dos dois simplesmente não desiste. E acho que essa sensação vem do fato de que correr atrás de um objetivo, principalmente se ele está a alguns passos de vantagem sobre você cansa. E cansa muito. E cansa mais um pouco. E é aí que, além da razão, está a teimosia. A teimosia aliada ao esforço dá em final feliz. Ainda que, ao longo do processo se mude muito de opinião, de postura, de jeito, de lado. Aí está um dos grandes valores dos heróis: eles até caem, mas não param.

Mas é pela trama bem amarrada e pelas cenas bem feitas que esse é um filmão. O resto, é divagação, dessas que andam tão presentes ultimamente nos meus dias.

14 comentários sobre “UM LIVRO, UM CD, UM FILME

  1. Não sabia do seu talento pra resenhas, Kari! Outra coisa pra vc investir.
    O CD dos LH é lindo, já tinha te cantado essa bola. Só que é mto triste, acho que faz mais sentido qdo a gente está sofrendo por amor, o que me leva a supor que vc ainda não está 100%… Mas vai ficar, tenho certeza. A dica do filme é ótima, e a do livro, vai ficar anotada, assim que der, invisto nela.
    Bjo carinhoso de quem te adora…
    Ful

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  2. Não gostei do cd, mas adorei o filme e o livro tb.

    Mas me diz aí, fui ler aqueles comentários sobre o post dos solteiros pra ver se achava um da Carlinha e vi lá no último comment uma declaração de amor, hein?! Não vai mesmo me contar quem é? Sou mais curioso que mulher pra essas coisas.

    Carlinha, ela não fica brava não, vou continuar te cantando nos comentários. Eheheheh. Vc parece ser uma gracinha de menina.

    Bjo, meninas.

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  3. Muito legal suas três escolhas…vou fazer a minha…um livro…Beatles Anthology…um cd…Tim Maia – Racional…um filme…Domésticas…
    Não esqueci do nosso papinho…continuo lembrando…quero mais…
    Um beijo no coração

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  4. Hmmm, valeu as dicas!!!!
    Vou correndo comprar o livro!!!! E o cd, vou tentar ouvir sem comprar…rsss, vai q num gosto, né… 🙂
    Zé, vc procura meus comments é?!! Idem! Rsss… Eu leio os seus e os do Ful… me divirto muito com a “troca de delicadezas” entre vocês dois… hahaha.
    Beijos a todos!

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  5. Mafalda:
    Aproveito pra colocar aqui os meus preferidos do momento:
    o livro é o que você me emprestou: CONFISSÕES DE UM HOMEM SINCERO, do nosso querido Fábio. Ele merece!!!
    o cd é de Rafael Creig, um cara anônimo, com uma voz deliciosa que fez uns arranjos incríveis para músicas brasileiras eternas e para a minha música preferida “se” do Djavan. Delicioso de se ouvir…
    o filme: “Colcha de retalhos” com minha atriz mais querida Winona Rider e uma história de mulheres no mínimo tocante.

    Recomendo para que você possa fazer uma resenha de cada um, com seu dom de escrever que está cada vez melhor.

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  6. Oiê!

    Amei o teu post em que vc fala de amor. Colei ele no meu blog, espero que vc nao se importa. [Com os devidos creditos, claro]

    Sempre que quero me informar e ler opiniões legais entro aqui. As vezes guardo uns textos teus, releio… Adoro!

    Beijos!!

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  7. Olha, moça, não sei se já disse isso antes, mas, é impressionante o seu talento para escrever. Fiquei emocionada com o texto do livro transcrito. Muito legal mesmo. E, apesar de ter visto O fugitivo tantas vezes, tenho de reconhecer que nunca pensei na história desse jeito. Brava!

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  8. Maravinha! Descobrir Los Hermanos é sempre uma grande emoção. Que bacana que você compartilhou essa tua experiência com os visitantes do blog. Agora, ouça os outros dois discos dos moços e conte aqui o que achou. Beijinho!

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